Os cogumelos mágicos fazem parte da história humana há milhares de anos.

mushrooms

Cogumelos contendo psilocibina são encontrados na maioria das zonas ecológicas em todos os continentes, exceto na Antártida.

Pesquisadores ainda estão estudando sobre a estimativa de quando os primeiros cogumelos de psilocibina surgiram.

Pesquisas não publicadas da Ohio State University e do departamento de biologia da Universidade de Utah sugerem que eles remontam há 75 milhões de anos – tornando-os muito mais antigos que o Homo sapiens.

Na América Central e na Sibéria existem claras evidências históricas sobre o uso de cogumelos mágicos há milhares de anos.

A arte asteca e maia, por exemplo, mostram os usos ritualísticos dessas substâncias.

Também existem evidências arqueológicas sugestivas sobre o consumo de cogumelos mágicos há 10.000 anos na Austrália. Algumas outras evidências mostram figuras de cogumelos no norte da África de cerca de 7.000 anos atrás e pinturas rupestres de cogumelos datados de 6.000 anos atrás na Espanha.

“Ao longo de nossa longa pré-história, os humanos devem ter encontrado esses cogumelos, quer esses encontros tenham evoluído ou não para tradições culturais completas”, afirma o biólogo Merlin Sheldrake, autor do livro ”Entangled Life: How Fungi Make Our Worlds, Change Our Minds, and Shape Our Futures”.

Ele está entre os especialistas que afirmam que é impossível que os caçadores-coletores não tenham aprendido sobre plantas alucinógenas, dado seu amplo conhecimento ambiental e as evidências que sugerem o possível uso de psilocibina entre as primeiras comunidades de agricultura e pastoreio do Neolítico.

A evolução humana

Uma das teorias mais controversas sobre os usos milenares da psilocibina foi escrita pelo etnobotânico e psiconauta Terence McKenna, em seu livro best-seller ”Alimento dos Deuses”.

Segundo McKenna, o passo fundamental na evolução humana do Australopithecus aos primeiros gêneros Homo foi catalisado por cogumelos psilocibinos. 

Em sua teoria, os ancestrais humanos percorriam as savanas africanas seguindo rebanhos de mamíferos herbívoros. Com isso, os primeiros humanos teriam encontrado e comido os cogumelos do gênero Psilocybe, que se desenvolvem no esterco desses tipos de animais.

No seu livro ”O Alimento dos Deuses”, o psiconauta apresenta a hipótese de que a adoção dos cogumelos psicodélicos dentro da dieta do Homo erectus fez com que o cérebro desses primatas ganhasse a capacidade de processar e organizar informações de maneira surpreendente.

Essa teoria nunca se confirmou, mas o que se sabe é que o consumo de cogumelos mágicos está presente na história da humanidade há milhares de anos.

Uso cultural

Apesar de evidências apontarem para incidentes isolados de consumo acidental de psilocibina, o desejo inerente dos humanos em alterar estados de consciência com plantas intoxicantes e psicoativas levou ao consumo cultural e ritualístico dessa substância.

Porém, existe uma parte da história que remonta à Inquisição e a caça às bruxas na Europa, quando as supostas culturas consumidoras de cogumelos mágicos tiveram que esconder o consumo cultural pela repressão do cristianismo.

Druidas britânicos e irlandeses, que, de qualquer forma, não mantinham histórias escritas, também podem ter sido forçados a esconder seu uso de cogumelos mágicos depois que suas práticas foram declaradas ilegais pelos romanos, que os massacraram antes que sua cultura fosse amplamente dominada pelo cristianismo.

Por isso, no Ocidente, existiam poucas evidências e relatos de consumo de psilocibina. Apesar dos estudiosos acreditarem que o uso dessa substância sempre existiu na história da humanidade.

E um micologista (biólogo especialista em fungos) amador, Gordon Wasson, trouxe novas perspectivas sobre o consumo de psilocibina, ainda que apenas na década de 1950.

Wasson estava procurando o misterioso ”teonanácatl” (cogumelo mágico), narrado em textos antigos como ”a carne dos deuses”, e chegou até María Sabina, no México.

María Sabina

“Graças a María Sabina, minha tataravó, a medicina ancestral dos cogumelos sagrados tornou-se mundialmente conhecida”, diz Andrés Donaldo, que faz visitas guiadas à propriedade de sua família, em Oaxaca, México.

“É incrível que María Sabina nos deixou essa cultura de uso de cogumelos medicinais”, afirma seu tataraneto Donaldo. “Ela nasceu com um dom especial para curar e continuar esse legado. É muito ancestral, estava aqui muito antes dela.”

Foi lá que Wasson se tornou o primeiro ocidental moderno a documentar uma cerimônia indígena do xi tó – cogumelo psicodélico na língua mazateca –, em 1955.

Wasson logo transmitiu suas descobertas para o mundo, suas experiências no México foram publicadas na revista Life, em 1957.

Milhões de pessoas começaram a voltar a atenção para a psilocibina, percebendo que os cogumelos mágicos eram capazes de expandir a consciência e mudar padrões de pensamento.

O artigo de Wasson também levou a um frenesi turístico. Milhares de turistas do mundo todo visitaram a comunidade onde vivia María Sabina para conhecer mais sobre os cogumelos mágicos.

Mas não só curiosos foram até lá, o fluxo intenso de estrangeiros causou diversos tumultos na comunidade. Parte da propriedade de María Sabina foi incendiada, seu filho foi assassinado e ela foi presa brevemente, acusada de vender drogas.

Em 1968, autoridades mexicanas enviaram militares para a região a fim de impedir que estrangeiros chegassem à cidade, por quase uma década, até sua morte em 1985, aos 91 anos, depois que a sociedade local se estabilizou.

María Sabina, ao preservar a característica de cura da psilocibina, influenciou toda a onda de estudos sobre essa substâncias desde a década de 1950.

McKenna que foi um dos principais micologistas do mundo afirmou: “os cogumelos são uma grande promessa de cura, não apenas para indivíduos com problemas de saúde mental, mas para pessoas interessadas em explorar a consciência ou se tornar pessoas melhores, e para as sociedades e o mundo como um todo”.

Esse conhecimento foi catalisado por María Sabina. Seu tataraneto comenta: “o fungo abre sua mente. Desperta seu terceiro olho… As pessoas só precisam ter esse respeito e consumi-lo dentro do processo adequado durante uma cerimônia. Então, o cogumelo pode ser nossa salvação”.

Na cultura Mazateca, os fungos psicodélicos sempre foram usados para conexão com o divino e para curar bloqueios espirituais e emocionais, que se acredita serem a raiz de doenças físicas.

Hoje, ainda existem algumas dúzias de curandeiros de cogumelos em Huautla – e a casa de Sabina sobrevive como um santuário para a famosa chjoón chjine (“mulher sábia”).

Cerimônias (conhecidas como kuá tí na kuáñ) acontecem até os dias de hoje, onde são consumidos os fungos locais que podem ajudar a identificar as causas das doenças, dar dicas de como elas podem ser tratadas e aliviar tensões.

Tentativas de repressão

Toda essa história de consumo cultural e ritualístico dos cogumelos vem acompanhada de tentativas de repressão do uso da psilocibina.

Nos anos 1500, missionários espanhóis que buscavam cristianizar os povos indígenas em toda a América Latina ficaram horrorizados com as cerimônias de cogumelos. O clero tentou impedir o uso de cogumelos psilocibina e destruir evidências de seu histórico de uso.

Na Europa, também houve a Inquisição e a caça às bruxas.

Um pouco mais à frente, com a popularização do uso dos fungos psicodélicos, desencadeada por Wasson, em 1968 a contracultura trouxe para perto essas substâncias (bem como o LSD).

Esse movimento hippie (anti-guerra do Vietnã) era visto como uma ameaça ao establishment dos Estados Unidos. Portanto, a psilocibina tornou-se ilegal, junto ao LSD e outras substâncias.

“Os psicodélicos chegaram como bombas à sociedade”, diz McKenna. “Eles são transformadores e disruptivos, mas os poderes autoritários não querem ouvir que seus filhos vão usar drogas estranhas e se alienar deles.”

Em seguida, veio a guerra às drogas.

Porém, apesar das pesquisas científicas sobre o tema ficarem estagnadas durante esse período, alguns estudiosos passaram a investigar as propriedades medicinais da psilocibina.

Legalização medicinal

Essas propriedades ”de cura” dos psicodélicos já haviam despertado a curiosidade da comunidade científica há tempos, mas só agora estão ganhando força.

A ampliação do conhecimento dos cogumelos mágicos estão dando origem a uma nova compreensão dessas substâncias.

“Nossa relação com os fungos está mudando e acho que será uma mudança irreversível”, disse o especialista Joe Perkins ao The Guardian. “É um reino totalmente separado de plantas e animais, e é possivelmente o maior reino sobre o qual sabemos muito, muito pouco.”

Hoje, os cogumelos mágicos estão sendo popularizados, cultivados e institucionalizados em uma escala sem precedentes, principalmente porque se mostram como uma promessa na área da saúde mental e prometem ser a próxima indústria bilionária.

Diversos locais do mundo já estão legalizando o uso terapêutico da psilocibina.

Com esses avanços, existe a preocupação de que o uso cultural e ritualístico se perca.

Enquanto essa indústria se consolida, o povo Mazateca – guardiões da cultura dos cogumelos mágicos – recebe pouco reconhecimento (inclusive financeiro) por seu papel em preservar os conhecimentos sobre essas substâncias.

Esperamos que todos sejam contemplados nessa revolução psicodélica e que todos possam desfrutar livremente dos poderes dos cogumelos mágicos.

Fonte: Vice

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